Pare de procurar pelo seu propósito e comece a procurar por você.
Uma reflexão sobre uma busca intensa que, na verdade, tem a ver com SENTIDO (e que está dentro de cada um de nós).
Photo by Smart on Unsplash
Desde que me entendo por gente eu vivia atrás de algo que eu não sabia exatamente o que era. Talvez a palavra sentido explicasse um pouco dessa minha vontade louca de fazer alguma coisa que realmente me tocasse a alma. Durante muito tempo, procurei nas minhas brincadeiras de infância algum indicativo de que eu estava no caminho dessa busca, mas as paixões eram tantas e os talentos estavam tão embolados num fio que eu não conseguia desenrolar que, anos depois, acabei me perdendo de vez. É que eu não sabia exatamente o que procurava, eu só sabia que procurava, entende? E sempre que tocava aquela canção, “I still haven´t found what I´m looking for”, a minha vontade era gritar um “tamo junto” em alto-falante para quem quer que me parecesse estar perdido também. Não, eu ainda não tinha encontrado aquilo que eu tanto procurava. Mas, o que é que eu procurava, afinal?
Eu não escalei as mais altas montanhas, é verdade. Mas, depois de me embrenhar no Teatro, numa tentativa quase visceral de me encontrar em outros personagens, interpretando outras vidas, trancar a faculdade de Jornalismo mais de três vezes, fazer períodos nos cursos de Relações Públicas e Pedagogia e, em algum momento do caminho, cogitar migrar para a Psicologia, dei de cara com a palavra propósito em letras garrafais. Propósito. Propósito. Propósito. Todo mundo só falava nisso, na necessidade de viver uma vida com mais propósito, de encontrar o nosso propósito, de trabalhar com propósito, de planejar com propósito, de escolher com propósito, de criar os filhos com propósito, estudar com propósito, sonhar com propósito… Propósito, propósito, propósito… E onde estava o meu?
O mundo estava inundado com a tal frase “trabalhe com o que você ama”, e então essa passou a ser a minha busca maior, o meu propósito, por assim dizer, porque eu simplesmente não podia admitir para mim mesma que eu não tinha um porquê suficientemente forte pelo qual lutar. “Faça o que você ama”, “tenha uma vida extraordinária”, “fuja da média”. E essas passaram a ser as minhas frases de efeito, as plaquinhas que eu procurava enxergar no meu caminho em direção ao tal do propósito. Mas, ao longo da caminhada, uma coisa interessante aconteceu: enquanto mais eu buscava por isso, menos capaz e mais frustrada eu me sentia. E por que, cargas d´água, isso acontecia?
Eu estava tão ansiosa e alucinada nessa busca que o meu estado mental não me deixava enxergar com clareza. Já aconteceu isso com você? As emoções estão tão à flor da pele que você simplesmente não consegue estacionar por um momento e raciocinar o que é que está acontecendo com você, como é que você chegou aonde você está agora, para onde você realmente deseja ir e, o mais importante nessa equação, quem você realmente é?
Era essa a grande questão, o grande pulo do gato, por assim dizer: buscamos por aquilo que amamos sem saber, na verdade, quem realmente somos. E se você nem sabe quem é na essência, como é que você quer saber o que você ama de verdade?
A busca por algo que nos traz propósito só pode ser uma consequência da clareza de quem você realmente é e do que você realmente valoriza na vida, porque quando você não tem ideia do que te preenche, de quais são seus valores mais preciosos, do que você gosta e do que você não tolera de jeito nenhum, de quais são seus sonhos e metas mais especiais, do que é importante e significativo pra você, do que te faz entrar em estado verdadeiro de fluxo, é como se uma venda estivesse nos seus olhos te impedindo de visualizar o caminho.
E daí, qual é a nossa tendência, nesse caso?
Nós nos deixamos guiar pelos ideais de sucesso e de felicidade dos outros, talvez seguindo por um caminho que não tenha nada a ver com o que realmente busca o nosso ser essencial.
As buscas
Depois de tantas buscas, encontros, desencontros e ciclos e mais ciclos de muito aprendizado e autoconhecimento, entendi que o propósito não é algo que você encontra por aí, mas, sim, algo que vai crescendo e evoluindo com você, na medida em que você se aproxima da sua essência, de pessoas, lugares, situações, atividades e até memórias que fazem com que você se sinta em casa, sem precisar fingir.
Sabe quando você se sente tão à vontade com alguém, em alguma atividade ou em algum lugar, que você simplesmente pode ser você mesmo plenamente, sem máscaras e sem disfarces?
Pois é exatamente disso que o propósito se trata: de VOCÊ*.
V = valores (o que é inegociável para você na vida)
O = objetivos (o que você almeja alcançar tendo como bússola os seus valores)
C = contribuição (de que forma você quer contribuir com o mundo - ou com você mesmo e/ou pessoas próximas a você - quando alcançar os seus objetivos)
E = essência (o seu self real, expresso nos seus talentos/pontos fortes, paixões/interesses e pontos que você tem a melhorar)
*O Método VOCÊ de construção e escolha de propósito é um método desenvolvido e testado por mim em quase 10 anos de atendimentos individuais e em grupo.
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Tá, e onde fica o trabalho com propósito?
Você pode ser muito bom num monte de coisas: falar em público, escrever, desenvolver tarefas manuais, tocar instrumentos musicais, liderar, ensinar, cozinhar, consertar computadores e o que for. Mas qual dessas coisas realmente te despertam INTERESSE e se alinham com os seus VALORES e OBJETIVOS de vida? Qual dessas suas habilidades realmente te conecta com a sua ESSÊNCIA?
Você já parou para observar o que realmente te faz entrar em FLUXO?
A importância do fluxo
Entrar em fluxo é simplesmente não ver o tempo passar, de tão absorvido que você fica naquela atividade. É perder a noção da hora, se dar conta de que o dia virou noite ou de que a noite virou dia num piscar de olhos. É se preencher plenamente daquilo, se completar com verdade. Gerar propósito.
Demorei muito para perceber que, embora eu tenha muita facilidade para me comunicar em público, e sim, seja muito comunicativa, o que mais me conecta com o meu ser essencial é a conversa profunda, individual, o olho no olho, as pausas, o que a boca não diz, entende?
É por isso que, embora eu também trabalhe com grupos e programas online (grupos pequenos e com vagas restritas, é verdade), não abro mão dos meus atendimentos individuais, porque eles me abastecem de propósito. Enquanto estou conversando com alguém, gero confiança e intimidade, crio laços de empatia e amizade, entendo melhor os porquês do outro e os meus próprios porquês também. No trabalho. Na vida. Aonde quer que eu vá.
É o suspiro que me encanta, a forma como um cliente sorri após uma grande descoberta, o arquear das sobrancelhas quando está com dúvidas, o fato de eu saber quem é, o que faz, com o que sonha, o que busca, o que já encontrou pelo caminho.
A partir do momento em que entendi isso, parei de me cobrar porque eu não estava fazendo megacampanhas para lançar meus produtos ou não tinha chegado a marcas numéricas expressivas que os meus amigos estavam chegando, apesar de ter público para isso. Eu entendi que o meu jeito de ser, em essência, era outro. Eu não tinha que me sentir menor ou inferior por isso.
E tudo bem também se você ESCOLHEU como propósito divulgar o seu trabalho para o maior número de pessoas que você puder. Tenho um orgulho danado de quem está conseguindo alcançar multidões. Mas, por enquanto, o que me chama mesmo é abraçar a minha vizinhança, entende?
Todo e qualquer propósito é louvável, desde que esteja alinhado com a verdade de cada um. Por quantas vezes meus clientes já se debateram com a ideia de que o que gostariam de fazer era fútil, ou pouco interessante, ou muito exótico, ou muito convencional, até realmente entenderem que, se essa escolha fazia sentido para eles (ou seja, se estava alinhada aos valores, objetivos, contribuição e essência), era esse o caminho?
Não se distraia
Não dá para se sustentar num disfarce por muito tempo. Para você se amar de verdade, você precisa ser de verdade também.
Pare de procurar seu propósito e comece a procurar por você.
É esse o caminho.
O seu caminho.
Para se inspirar:
TEDx “À propósito, vamos falar de propósito”, com Milena Brentan. Nesta palestra do TEDxInatel, a psicóloga fará uma reflexão sobre a importância do alinhamento entre trabalho e o real propósito de vida das pessoas, além do impacto que isso traz para a sociedade.
TEDx “Em busca do propósito”, com Carla Furtado. Diretora do Instituto Feliciência, especialista em felicidade e realização pessoal, Carla Furtado (que já foi minha professora em uma das minhas pós-graduações), fala sobre como se encontrar na eterna busca pelo sentido da vida e pelo propósito do trabalho.
TED Talk “Flow, the secret to happiness” (“Flow, o segredo da felicidade”), com Talk Mihaly Csikszentmihalyi. Csikszentmihalyi analisa aqueles que encontram prazer e satisfação duradoura em atividades que levam ao estado de "Flow".
Com amor,
Ana.
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